Comentários sobre a obra "A falácia socioconstrutivista: por que os alunos brasileiros
deixaram de aprender a ler e escrever", de Katia Simone Benedetti, 2020.
Na obra A falácia socioconstrutivista: por que os alunos brasileiros
deixaram de aprender a ler e escrever, lançada em 2020 pela Editora Kirion, a professora Kátia Benedetti apresenta uma crítica rigorosa ao
domínio do socioconstrutivismo na educação brasileira, sobretudo no ensino da
leitura e da escrita. Desde o prefácio, o neuropsicólogo Vitor Haase denuncia a
adoção de práticas pedagógicas fundamentadas mais em ideologias do que em
evidências científicas, apontando a necessidade de resgatar o ensino com base
na ciência cognitiva.
Benedetti sustenta que, sob a hegemonia do socioconstrutivismo e
do relativismo pedagógico, a alfabetização foi substituída por abordagens
centradas no que se denominou letramento e multiletramento, que priorizam o
contexto social e os gêneros textuais em detrimento da aprendizagem técnica do
código alfabético. Esse deslocamento, argumenta a autora, comprometeu o acesso
pleno à linguagem escrita, especialmente para os alunos socialmente
desfavorecidos, que dependem da escola como principal fonte de instrução.
Ao revisar criticamente a apropriação das teorias de Piaget e
Vygotsky, Benedetti mostra como esses autores foram reinterpretados para
justificar a rejeição da instrução direta, promovendo uma pedagogia que exalta
a autonomia precoce do aluno e marginaliza o papel estruturante do professor.
Essa visão, amplamente difundida nas licenciaturas, dificultou a formação
docente voltada ao ensino sistemático da leitura e da escrita.
O cerne da argumentação da autora se apoia em pesquisas da
neurociência cognitiva, especialmente nos trabalhos de Stanislas Dehaene[1],
que demonstram que a leitura não é uma habilidade espontânea, mas uma
construção que requer o desenvolvimento da consciência fonêmica e a
correspondência entre sons e letras. Ignorar essa base biológica, segundo
Benedetti, resultou na generalização de métodos ineficazes e na perpetuação de
desigualdades educacionais.
A autora também critica o conteúdo e a organização dos currículos
escolares, como os estabelecidos pela Base Nacional Comum Curricular (BNCC),
por anteciparem competências interpretativas antes do domínio do código. As
práticas pedagógicas decorrentes, como a escrita espontânea, a exposição
precoce a textos complexos e o desprezo pelo ensino fonêmico, falham em
proporcionar a automatização da leitura e sobrecarregam a memória de trabalho
dos alunos, prejudicando a compreensão textual.
Benedetti alerta para as consequências desse
cenário: estudantes que avançam no sistema de ensino sem dominar habilidades
básicas de leitura e escrita, o que compromete sua trajetória escolar e social.
Na conclusão, propõe a reconstrução do ensino da alfabetização com base em
métodos estruturados, progressivos e cientificamente validados, capazes de
garantir equidade no acesso ao saber.
Ao articular uma crítica ideológica com fundamentação empírica e
proposições concretas, A falácia socioconstrutivista se destaca como uma
obra relevante a todos os educadores e formuladores de
políticas públicas, convidando-os a reverem premissas consolidadas e, ainda, recolocando no centro da escola a aprendizagem
efetiva e não modismos pedagógicos.
[1] DEHAENE,
Stanislas. Os neurônios da leitura: como a ciência explica nossa capacidade
de ler. Porto Alegre: Penso, 2012.