domingo, 9 de dezembro de 2018

Irresponsabilidade fiscal


Irresponsabilidade fiscal

Marco Milani*

(Texto publicado no Jornal Gazeta de Limeira, em 08/12/18, p.15)

Ao apagar das luzes de seus mandatos, 300 deputados federais aprovaram, em 05/12/18, o Projeto de Lei Parlamentar 270/2016 que afrouxa a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). De autoria do senador Otto Alencar - PSD/BA, o projeto permite que os municípios ultrapassem o limite de gastos com despesa de pessoal sem sofrer punições caso a receita tenha queda superior a 10% em decorrência da diminuição das transferências recebidas do Fundo de Participação dos Municípios.
         A LRF determina que estados e municípios não comprometam mais de 60% das receitas de gastos com pessoal.
Sob a alegação de que os prefeitos não poderiam ser penalizados por tal redução involuntária da receita e consequente aumento da proporção dos gastos, defensores do projeto supõem ser uma medida justa e benéfica. Será?
         O controle dos gastos com pessoal está no cerne da LRF e enfraquecê-lo implica incentivar o desequilíbrio fiscal e suas danosas consequências econômicas e sociais. Diante da redução de receitas, nada mais óbvio do que também se gastar menos promovendo-se os ajustes necessários como suspender novas contratações de funcionários, não se aumentar salários etc.
         A insistência no desequilíbrio fiscal culmina, cedo ou tarde, com a ausência de recursos para honrar os compromissos, inclusive com a folha de pagamento e investimentos. É, portanto, altamente prejudicial à sociedade a medida de se permitir ultrapassar os limites estabelecidos de gastos.
         A posição exclusivista que objetiva privilegiar determinado grupo de interesse no curto prazo em detrimento do equilíbrio fiscal no longo prazo já forneceu inúmeros exemplos nos cenários brasileiro e mundial sobre os malefícios que provoca.
          A miopia econômica pode fazer com que alguns considerem a elevação contínua do nível de endividamento como alternativa viável para se compensar a irresponsabilidade fiscal, mas não é. Em algum momento a conta vence, com juros.
         O texto aprovado na Câmara agora segue para sanção presidencial. Esperemos que Michel Temer o vete e não fragilize ainda mais as contas públicas. Recentemente, o presidente aprovou o reajuste salarial de 16,38% para os ministros do Supremo Tribunal Federal, fato esse que gerará, pelo consequente aumento dos salários de todos os magistrados federais e integrantes do Ministério Público, um impacto negativo nas contas do governo de, aproximadamente, R$ 4 bilhões por ano.
          Que a responsabilidade fiscal possa, um dia, não apenas ser respeitada por força de lei, mas também por uma questão ética.

* Economista. Pós-Doutor pela Universidade de Salamanca (Espanha). Professor da Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP