Vergonhoso apoio a Maduro
Editorial OESP
Em vez de assumir suas
responsabilidades e pressionar o governo da Venezuela a dialogar com a oposição
para superar a violenta crise no país, o governo brasileiro prefere fazer de
conta que nada está acontecendo. O assessor especial da Presidência para
Assuntos Internacionais, Marco Aurélio Garcia, esteve recentemente na Venezuela
e disse que há uma "valorização midiática" dos confrontos. "O
país não parou, as coisas estão funcionando", afirmou Garcia. Não se trata
de autismo, mas de uma estudada farsa, cujo objetivo é fazer crer que Nicolás
Maduro tem a situação sob controle e que as manifestações só são consideradas
importantes pelos "veículos de comunicação internacionais".
Desse modo, o governo
petista continua a seguir a estratégia de desmerecer os protestos contra o
chavismo, como se estes fossem mero alarido de quem foi derrotado nas urnas, e
não uma legítima expressão de descontentamento com os rumos que o país tomou
nos últimos anos. Essa política explica por que o Brasil aceitou subscrever a
indecente nota do Mercosul que criminalizou os oposicionistas venezuelanos.
Enquanto Garcia finge
que tudo não passa de invenção da imprensa - segundo ele, Maduro vai se
encontrar com jornalistas estrangeiros para "aclarar os fatos" -, a
situação na Venezuela se deteriora a cada dia. Um dos mais importantes sinais
de que a desestabilização pode estar se espalhando inclusive entre os militares
foi a destituição de três coronéis da Guarda Nacional Bolivariana. Eles são
acusados de criticar a repressão aos manifestantes.
Além disso, em
inegável tom de confronto, Maduro ordenou, durante um desfile militar, que as
milícias chavistas dissolvessem barricadas erguidas por manifestantes. Esses
grupos paramilitares, que agem impunemente à margem da lei, são justamente a
vanguarda da repressão oficial aos manifestantes. O número de mortos em um mês
de protestos já chega a 20, e há inúmeras denúncias de violações de direitos
humanos por parte das forças governistas.
Foi diante desse
quadro que um grupo de ex-presidentes latino-americanos, entre os quais
Fernando Henrique Cardoso, decidiu publicar uma carta na qual critica a
"repressão desmedida" contra "manifestações estudantis de
protesto pacífico" e cita, com preocupação, os testemunhos de
"tortura e tratamento desumano e degradante por parte de
autoridades". A mensagem exorta Maduro a, "sem demora", criar
condições para o diálogo com a oposição, pedindo o "fim imediato" da
perseguição a estudantes e dirigentes oposicionistas, o fim da hostilidade à
imprensa independente e a libertação dos detidos nos protestos, em especial do
líder Leopoldo López - acusado pelo governo de ser o principal articulador dos
protestos.
Era essa a mensagem
que deveria constar das manifestações da diplomacia brasileira em relação à
crise venezuelana, e não o cinismo de quem acha que nada está acontecendo. Mas
o governo petista prefere endossar a beligerância de Maduro - que rompeu
relações com o Panamá apenas porque esse país sugeriu uma reunião da
Organização dos Estados Americanos (OEA) para discutir a situação. A OEA, como
se sabe, é para os chavistas o equivalente à encarnação do diabo, por ter os
Estados Unidos como membro.
Conforme informou
Marco Aurélio Garcia, a única instância aceitável de diálogo para Maduro é,
claro, a União de Nações Sul-americanas (Unasul) - aquela que, em sua última
reunião de cúpula, exaltou o "impulso visionário" do falecido
caudilho Hugo Chávez para a criação da entidade e que é atualmente presidida
pelo notório Dési Bouterse, ex-ditador e atual presidente do Suriname,
procurado pela Interpol por narcotráfico.
Sem poder contar com
os países vizinhos mais importantes para constranger Maduro a interromper a
violência e negociar de fato, resta à oposição seguir a prudência de Henrique
Capriles, seu principal líder. Para ele, embora os protestos sejam legítimos, a
única solução para a crise é a "saída eleitoral", porque "a
maioria do país apoia a Constituição e quer viver numa democracia".
Fonte: Jornal O Estado de S.Paulo
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