Os anticapitalistas: os bárbaros chegam aos portões
por Larry J.
Sechrest*
[Esse discurso foi apresentado na Austrian Scholars
Conference (Conferência dos Acadêmicos Austríacos), ocorrida no Ludwig von
Mises Institute, em Auburn, Alabama, em memória de Ludwig von Mises. O discurso
original está disponível no arquivo de áudio e no YouTube. Publicado
originalmente em 23 de junho de 2008]
Uma coisa é absolutamente clara: tanto o
espírito como a genialidade de Ludwig von Mises estão vivos e passam bem aqui
no Mises Institute. A amplitude e a profundidade da erudição encontrada nessas
conferências anuais são realmente singulares. De fato, a natureza
transdisciplinária de grande parte de seu trabalho talvez seja coisa única no
mundo acadêmico. Mises estaria, creio eu, extremamente orgulhoso de todo o
trabalho sendo feito em seu nome — mesmo, e talvez até principalmente, daqueles
cujas conclusões divergem da sua em alguns pontos.
A magistral biografia de Mises, Mises: The
Last Knight of Liberalism, escrita por Guido Hülsmann, cuidadosamente
documentou o fato de que este era verdadeiramente um homem de consciência e
intelecto, um homem absolutamente dedicado a buscar a verdade. Ayn Rand certa
vez fez uma observação que penso ser bem adequada para Mises, não obstante
tenha sido feita em um contexto de discussão sobre teorias educacionais. Ela
incitou seus leitores a "observar a intensidade, a austeridade, a
seriedade sisuda com que uma criança observa o mundo à sua volta. (Se você
chegar a encontrar, em um adulto, esse grau de seriedade quanto à realidade,
você terá encontrado um grande homem)" (The New Left, p. 156). No seu processo de busca pela verdade, esse
grande homem infalivelmente exibiu o que eu gosto de rotular de "crueldade
nobre". Entender fenômenos complexos era o que importava. Compreender a realidade
era o objetivo que compeliu toda a vida de Mises, e não a popularidade, o
desejo de vencer debates, ou o desejo de barganhar aprovação política. Ademais,
essa busca era para ser empreendida dentro de um contexto social de civilidade
e até mesmo de elegância.
Ou seja: tudo que é tão estranho ao nosso
mundo atual. Hoje, o tipo de integridade inexpugnável que Mises possuía é
menosprezada como sendo "dogmatismo", porque creem que a verdade é
algo ilimitadamente maleável. Seu decoro um tanto aristocrático é difamado como
"elitista" e "reacionário", porque todos os coletivistas
são fascinados apenas por coisas proletárias. Sua preocupação profunda com os
fundamentos epistemológicos da economia é aviltada como sendo tagarelice
pedante, porque vivemos em um mundo "humeano" (alusão a David Hume)
no qual a profundidade da lei da causalidade é rotineiramente deixada de lado
em favor do glamour da correlação estatística. E sua defesa heroica do
capitalismo laissez-faire é rejeitada como estando "fora de sintonia com a
realidade", sob o argumento de que tal sistema econômico é impassível,
grosseiro, esbanjador, injusto e explorador, para não mencionar as alegações de
insensibilidade às "reais necessidades humanas".
Capitalismo e Inveja
É essa última questão — o capitalismo e sua
poderosa defesa feita por Mises, bem como as graves implicações dos ataques
usuais ao capitalismo e as características desses atacantes — que pretendo
examinar hoje. Permitam-me primeiro declarar abertamente o que entendo por
"capitalismo". É verdade que eu encolheria o estado bem mais do que
Mises encolheria, mas nós dois temos o mesmo objetivo amplo: um sistema
econômico laissez-faire totalmente desregulamentado, um no qual os direitos de
propriedade são sagrados, a busca por lucros é vista como uma iniciativa nobre,
e o dinheiro é um símbolo de uma conquista honorável — ao invés de ser
censurado como sendo uma ferramenta sórdida usada apenas por aqueles que são
lamentavelmente destituídos de qualidades humanas. Trata-se simplesmente do
liberalismo — no sentido clássico do termo — aplicado às questões diárias da
nossa vida. Lembrem-se que Mises insistia que "a liberdade é indivisível.
Aquele que não tem a faculdade de escolher uma dentre várias marcas de sopa ou
comida enlatada, também está destituído do poder de escolher um dentre vários partidos
e programas políticos.... Ele já não é mais um homem; ele se torna um fantoche
nas mãos dos supremos engenheiros sociais" ("Liberty and
Property," Two Essays, p. 27).
Alhures, Mises declarou que, se condensado em
uma única palavra, liberalismo significa propriedade — mantida privadamente e
protegida severamente pela lei (Liberalismo, p. 19).
Em termos concretos, por capitalismo eu
entendo uma economia sem impostos progressivos, sem banco central, sem um
papel-moeda não lastreado, sem proibições às drogas, sem proibições às armas,
sem "ações afirmativas" que obrigam a garantir o emprego de algum
determinado grupo étnico, sem um sistema de saúde gerido pelo governo, sem
ministérios da educação, da energia, do trabalho, da segurança, da saúde, sem
DEA (agência antidrogas), BATFE (agência que regulamenta álcool, tabaco, armas
de fogo e explosivos), SEC (agência que regulamenta a bolsa de valores —
equivalente à nossa CVM), EPA (agência que regulamenta o meio ambiente), FTC
(agência que regulamenta o mercado, para "proteger o consumidor"),
FDA (agência de vigilância sanitária, equivalente à nossa Anvisa), sem um
salário mínimo determinado, sem controles de preços, sem tarifas, sem
assistencialismo — doméstico ou externo, rural ou urbano, para os ricos ou para
os pobres. Vocês sabem, uma economia livre!
Abrindo um parênteses, eu fico estupefaciado
com a quantidade de vezes que as pessoas hoje em dia falam em "livre
mercado" e, ao mesmo tempo, incluem nesse termo a presença do Banco
Central, da Previdência Social, da Receita Federal, ad nauseum. Que parte da
expressão "livre" elas não entenderam? Eu, de minha parte, quando
falo "livre mercado" obviamente não me refiro a essa gárgula
desfigurada, atormentada, torturada e distorcida que costumeiramente se faz
passar por capitalismo hoje em dia. Quem estaria disposto a arriscar sua
"vida, liberdade e honra sagrada" para proteger e manter essa
monstruosidade? Não eu, garanto-lhes.
Se isso é capitalismo, então o que faz com
que muitos se oponham a ele tão energicamente?
De fato, como pode alguém fazer qualquer objeção
ao capitalismo quando se reconhece que foi ele — até mesmo em sua forma
atenuada — o responsável por um aumento tão vigoroso do padrão de vida, de
forma que uma pessoa comum de hoje desfruta de "luxos" que nem mesmo
os monarcas hereditários puderam ostentar 200 anos atrás? Mises fornece duas
respostas básicas a essa pergunta: inveja e ignorância.
Primeiro, em relação à inveja, ele declara:
O que
faz com que muitos se sintam infelizes no capitalismo é o fato de que este dá a
cada um a oportunidade de chegar às posições mais cobiçadas que, é claro, só
serão alcançadas por alguns. Tudo o que o homem consegue ganhar será sempre uma
mera fração do que a sua ambição o impeliu a ganhar. Existem sempre diante de
seus olhos pessoas que tiveram êxito onde ele falhou... O sistema de preços e
de mercado do capitalismo é um tipo de sociedade na qual o mérito e os
empreendimentos determinam o sucesso ou a derrota do homem. (A Mentalidade Anticapitalista, pp. 12, 14).
Mises observa que, para muitos, o feudalismo oferecia
confortos psicológicos não disponíveis em uma sociedade capitalista. "Em
uma sociedade baseada em casta e status, o indivíduo pode atribuir o destino
adverso a condições que estão além de seu controle... não há motivos para que
ele se envergonhe de sua pobreza... No regime capitalista a coisa é diferente.
Aqui, a situação de vida de cada um depende de seus próprios feitos." (A
Mentalidade Anticapitalista, pp. 11).
Inveja e ressentimento, conquanto sejam
condenados por praticamente todos os sistemas de ética conhecidos, secular ou
religioso, parecem estar sempre sorrateiramente escondidos em alguma parte
primitiva de um grande número de psiques humanas. O fato de tais emoções serem
realmente primitivas é explorado em detalhes por Helmut Schoeck em seu livro
Envy: A Theory of Social Behaviour (Inveja: Uma Teoria do Comportamento
Social), de 1966. Nesse livro ele explica, em termos memoráveis, o
funcionamento do mecanismo:
O que é conclusivo.... é a convicção que o
invejoso tem de que a prosperidade do invejado, seu sucesso e sua renda são de
alguma forma os culpados pela sua privação, pela carência que sente.... Uma
tendência autocompassiva de se contemplar a superioridade ou vantagem alheia,
combinada a uma vaga crença de que o outro é a causa de sua privação, também é
encontrada entre os membros instruídos da nossa sociedade moderna, que
definitivamente precisam se aprimorar. A crença dos povos primitivos em magia
negra se difere muito pouco das idéias modernas. Da mesma forma que o
socialista acredita que ele é roubado pelo empregador, assim como o político de
um país em desenvolvimento acredita que está sendo roubado pelos países
industrializados, o homem primitivo acredita que está sendo roubado pelo seu
vizinho, de modo que este último conseguiu, através da magia negra, transportar
para seus campos a colheita do primeiro. (págs. 23, 51)
Considerem o que acontecerá se, ao repugnante
ímpeto para a inveja, fosse anexada uma percepção errônea da realidade. Ou
seja, o que aconteceria se as pessoas não conseguissem entender que todo o
progresso econômico e tecnológico foi trazido por indivíduos laboriosos que se
esforçaram para aplicar razão aos problemas da vida? É provável, nesse caso,
que tal progresso passaria a ser considerado uma dádiva "automática"
da Natureza ou de Deus, e que, portanto, todos os humanos mereceriam dividir
igualmente essas bênçãos naturais. Mas e se um vizinho, ou um empregador, ou
algum afamado industrialista possuísse uma cesta maior desses bens materiais? A
conclusão seria óbvia: ele deve ter se apropriado injustamente daquele excesso;
portanto, ele deve ser um explorador. Ademais, o sistema social que permitiu,
ou, mais ainda, encorajou tal resultado, deve ser um sistema corrupto.
Mises descreveu como pensam os fomentadores
desse tipo de atitude:
[O
capitalismo] coroa o salafrário desonesto e inescrupuloso, o trapaceiro, o
explorador, o "individualista grosseiro".... Nas condições do
capitalismo, o homem é obrigado a escolher uma das duas opções:virtude e
pobreza ou imoralidade e riqueza.(A Mentalidade Anticapitalista, pp. 14).
Em outras palavras, o capitalismo não evoca
somente comentários sóbrios e relutantes sobre sua deplorável incapacidade; ele
provoca condenações rancorosas e hipócritas. Não é algo do tipo: "Bem, é
uma pena que o capitalismo não funcionou, pareceu uma boa idéia". Não, os
comentários são de tipo: "Nenhum ser humano decente pode ser a favo do
capitalismo laissez-faire; esse sistema é sinônimo de racismo, sexismo e
estupro da Mãe Terra; ele é aditivado pela avareza, é guiado pela malícia, é a
institucionalização genuína da exploração!"
Como réplica, pode-se obviamente descrever o
socialismo como a institucionalização da inveja. Por exemplo, Karl Marx
apresentou de maneira bem explícita o processo do progresso econômico, e seu
concomitante aumento dos salários reais, em termos relativos ao invés de
absolutos:
Se o capital está aumentando rapidamente, os
salários podem subir: mas o lucro do capital aumenta incomparavelmente mais
rápido. A posição material do trabalhador melhorou, mas em detrimento de sua
posição social. O abismo social que o separa do capitalista se alargou.
("Trabalho Assalariado e Capital," Trabalhos Selecionados, Vol. I, p.
94)
É através desses truques de prestidigitação
que Marx conseguiu lidar com o fato de que os trabalhadores agrícolas
britânicos experimentaram um aumento real de 40% em seus salários entre 1849 e
1859, e ainda assim rejeitar tal fato como insignificante. (Sowell, Marxism, p.
138).
Na realidade, não é apenas o comunismo marxista
que consagra a inveja em suas doutrinas e práticas. O moderno estado
assistencialista também é culpado. Schoeck, ainda nos anos 1960, fornece vários
exemplos de nações nas quais seus cidadãos, movidos pela inveja e pelo
ressentimento, exigiram saber as rendas de seus compatriotas:
O
procedimento de se tornarem públicas as declarações de renda é encontrado,
casualmente, em comunidades suíças, onde é possível descobrir, sem qualquer
motivo válido, o valor da renda e dos ativos declarado por um vizinho ou
concorrente.... Existe... [na Suécia] uma empresa privada que produz anualmente
uma lista muito consultada que fornece as rendas de todas as famílias que
ganham mais de $3600 por ano.... [E até mesmo nos Estados Unidos], entre 1923 e
1953, no estado de Wisconsin havia uma lei que permitia a qualquer um examinar
as declarações de renda de qualquer cidadão, em todos os detalhes e
particularidades. (Envy, pp. 35, 386).
É claro, a taxação progressiva é em si uma
profunda manifestação de inveja. De fato, todos os impostos — sejam eles sobre
venda, consumo, renda ou qualquer outro — são irrevogavelmente artifícios de
redistribuição, como eu e outros já argumentamos através de publicações.
Entretanto, um imposto de renda progressivo é o caso mais ostensivo. Por um
lado, se impostos fossem de fato um substituto para alguma tarifa justificável
que fosse coletada como pagamento para serviços governamentais, comprovadamente
exigidos pelos cidadãos de uma nação, então tais impostos deveriam ter uma base
per capita; não deveriam ser determinados como uma porcentagem crescente da
renda. Ou, se o valor do serviço estivesse relacionado à magnitude monetária
envolvida — como no caso de se proteger a propriedade contra roubo —, o imposto
deveria ser, no máximo, uma porcentagem fixa do valor protegido. Adotar um
imposto de renda progressivo significa declarar abertamente que o objetivo é a
punição.
De acordo com Schoeck, a inveja está no âmago
da questão: "a sensação subjetiva de bem-estar de cada grupo de renda é
prejudicada pelos grupos de renda que estão acima. Com o objetivo de se livrar
desse 'sentimento de privação', recorre-se ao imposto de renda
progressivo" (Envy, pp. 365).
Além de identificar a inveja como a principal
razão de ódio ao capitalismo, Mises também oferece um interessante comentário
sociológico sobre as várias subcategorias de anticapitalistas. Existem, é
claro, os intelectuais: "Advogados e professores, artistas e atores,
escritores e jornalistas, arquitetos e cientistas, engenheiros e químicos"
(p. 17). Sua antipatia pelo capitalismo é basicamente uma projeção em nível
macro de uma mesquinharia em nível micro. Para o intelectual típico, sua
"veemente aversão ao capitalismo não passa de simples subterfúgio do ódio
que sente pelo sucesso de alguns 'colegas'" (p. 18).
Os trabalhadores de "colarinho
branco" tendem a sofrer uma aflição adicional: "Sentado atrás de uma
escrivaninha, anotando palavras e números num papel, ele tende a supervalorizar
o significado do seu trabalho.... Muito vaidoso, ele se imagina parte da elite
gerencial da empresa e compara suas tarefas com as do chefe" (p. 21).
Em outras palavras, por que se deveria ter
alguma estima pelo capitalismo sabendo-se que se trata de um sistema no qual os
presidentes das grandes corporações recebem salários multimilionários para
executar tarefas que poderiam ser igualmente bem feitas pelo funcionário típico
da empresa? Esse tipo de comportamento arrogante por parte dos colarinhos
brancos é estimulado e reforçado pelas confusas declarações de muitos
esquerdistas. Se gerenciar um negócio lucrativo não exigisse mais do que uma
habilidade para manusear o registro de informações, então qualquer escriturário
substituto que tenha alguma competência poderia realmente ser um empreendedor
de sucesso. Entretanto, como Mises nos lembra, a tarefa do empreendedor é bem
mais desafiadora do que isso. A sua tarefa depende de uma mente ativa e ágil.
Infinitas alternativas abstratas ou concretas abundam. Uma cadeia complicada de
causalidade deve ser distinguida e, então, classificada.
O empreendedor deve lidar com a inevitável
escassez dos fatores de produção, a incerteza das condições futuras — as quais
a produção tem de suprir —, e a necessidade de selecionar, a partir de uma
desconcertante gama de métodos tecnológicos apropriados à consecução dos
objetivos já determinados, aqueles que prejudiquem o menos possível a obtenção
de outros fins — isto é, aqueles com os quais o custo da produção é mais baixo.
Nenhuma alusão a estes assuntos pode ser encontrada nas obras de Marx e Engels.
Tudo o que Lenin pôde aprender sobre negócios — a partir das histórias de seus
camaradas que eventualmente trabalharam em escritórios comerciais — era que
eles exigiam uma porção de rabiscos, anotações e cifras. (p. 24)
Há também um fenômeno intrafamiliar que
"desempenha um papel importante nas modernas maquinações e propagandas
anticapitalistas" (p. 27). Nesse ponto, Mises faz uma distinção entre os
"patrões" e os "primos" dentre as famílias que possuem
grande riqueza. Os primeiros consistem naqueles poucos cujos talentos empresariais
os tornam capazes de gerir os negócios da família. Em cada geração, haverá
nessa categoria provavelmente não mais do que um ou dois filhos ou netos do
patriarca. Completamente dependentes dos "patrões" são os
"primos", dentre os quais incluem-se "irmãos, primos, sobrinhos
dos patrões, ou quase sempre irmãs, cunhadas viúvas, primas, sobrinhas
etc." (p. 27). Os membros desse último grupo "foram educados em
modernas escolas e faculdades, cujo ambiente é marcado por um desprezo
arrogante referente ao mecânico enriquecimento. Alguns deles passam o tempo em
clubes, boates, apostam e jogam, divertem-se e farreiam, chegando à devassidão.
Outros, amadoristicamente, ocupam-se com pinturas, literatura ou outras artes.
Por isso, grande parte delas são pessoas desocupadas e inúteis" (p.28).
Na realidade, elas são mais do que inúteis.
Dado que eles são calamitosamente ignorantes tanto dos princípios da economia
como da natureza prática dos negócios, eles logo concluem que (1) o capital
criado por seus predecessores deve ser uma fonte infinita e autossustentável de
renda para todos os seus descendentes, (2) a maior fatia dessa renda desfrutada
por seus parentes, os "patrões", que são quem de fato gerenciam os
negócios, trata-se de um excesso imerecido, e que, (3) portanto, eles estão
certos em injuriar e se rebelar contra os "patrões" e o sistema que
eles representam — o capitalismo. "Os 'primos' se dispõem a apoiar greves
até mesmo de onde provêm seus próprios rendimentos.... [Eles] sustentam
universidades progressistas, colégios e institutos destinados à 'pesquisa
social' e patrocinam todo tipo de atividades do partido comunista. Na condição
de 'socialistas de salão' e de 'bolchevistas de cobertura', desempenham papel
importante no 'exército proletário' em luta contra o 'funesto sistema de
capitalismo'" (p.30)
Mises parecia ter uma opinião bem negativa
sobre atores, porque ele os menciona como uma espécie de pretensos intelectuais
e, logo depois, retorna a eles com carga máxima, quando detona a Broadway e
Hollywood por serem "incubadoras do comunismo" e lar de muitos que
estão "entre os mais fanáticos defensores do regime soviético" (p.
31). Sua explicação para esse fato se apóia em sua percepção dos artistas como
seres atormentados por um poço sem fundo de insegurança:
A essência da indústria do entretenimento é a
variedade. As pessoas aplaudem mais o que é novo e, por isso mesmo, inesperado
e surpreendente. São extravagantes e volúveis.... Um magnata do palco ou da
tela deve sempre temer os caprichos do público.... Ele está sempre agitado pela
ansiedade. (p. 32)
Essa parece ser uma observação trivial. Tudo
bem, artistas de todas as variedades provavelmente são pessoas muito inseguras.
Mas, então, o que os empurra tão violentamente para a esquerda? A resposta
dupla de Mises é que eles se atiram para o comunismo porque (a) por serem tão
deficientemente instruídos como muitos outros, eles acreditam na propaganda que
declara ser o comunismo a panaceia para toda a infelicidade e (b) eles se
concebem a si próprios como "pessoas trabalhadoras, companheiras de todos
os outros trabalhadores" (p. 32).
Francamente, essa não é uma explicação muito
satisfatória. Alguém poderia imediatamente perguntar por que essa mesma
observação não poderia ser usada com igual força para explicar a propensão à
esquerda encontrada em muitas camadas da sociedade. Por que isso é típico dos
artistas?
O fenômeno dos "comunistas de
Hollywood" é de fato notável. E, é claro, ele continua até hoje. Não se
trata de um mero artefato da Década Vermelha de 1930. Isso foi fácil de notar,
nas últimas semanas, com os murmúrios adoradores que emanaram por ocasião da
aposentadoria daquele ditadorzinho barato, Fidel Castro. Steven Spielberg,
produtor e diretor afamado, classifica uma audiência que teve com Fidel Castro
como "as oito horas mais importantes da minha vida". O ator Jack
Nicholson classificou Fidel como "um gênio". A cultura popular está
profundamente infectada de visões deformadas como essas. Assim, seria
conveniente tentar entender seriamente as razões por trás disso. Com essa
finalidade, permitam-me fazer uma modificação e uma ampliação da hipótese de
Mises.
Mas antes, deixem-me fazer uma ressalva. Eu
não possuo qualquer experiência direta com o mundo dos atores, diretores e
dramaturgos. Contudo, meu filho é um ator profissional, com um interesse agudo
nas obras de Shakespeare. Devo acrescentar, de passagem, que ele também é um
libertário radical que foi exposto prematuramente às obras de Rothbard, Rand,
Spooner e Heinlein — o que faz dele, no mundo teatral, um espécime muito raro.
E o que é mais importante para o propósito atual: isso significa que ele não
enxerga seu ofício através das lentes distorcidas dos "comunas da
Broadway".
As conversas com meu filho iluminaram vários
dos ângulos mais escuros dessa questão. Primeiramente, os atores foram por
séculos rejeitados por pertencerem às mais baixas classes sociais. Pessoas
envolvidas com teatro eram mantidas separadas do resto culto da sociedade. Por
exemplo, alega-se que até há alguns anos, já no século XX, em muitas cidades
americanas atores falecidos não podiam ser sepultados em cemitérios de igrejas.
O escritor H.L. Mencken expressou um pouco desse menosprezo quando, escrevendo em
1926, declarou:
Os homens não são iguais, e muito pouco pode
ser aprendido sobre os processos mentais de um congressista, de um sorveteiro,
ou de um ator de cinema ao se estudar os processos mentais de um homem
genuinamente superior. (Notes on Democracy, pp. 15-16)
Por causa dessa imagem universalmente
negativa, há muito tornou-se tradicional entre os atores se verem a si próprios
como párias. E isso faz com que muitos deles se identifiquem vigorosamente com
os mais pobres da classe trabalhadora. Dado também sua crença errônea de que o
socialismo de fato serve aos interesses do proletariado, eles automaticamente
abraçam a esquerda. Ademais, atores veem a si próprios como "intelectuais
da vanguarda", não obstante o fato de que eles raramente podem ostentar
muito em termos de treinamento erudito. Mas dado que a esquerda, especialmente
nos EUA, foi muito bem sucedida ao se retratar como a oposição progressiva e
iluminada aos membros intolerantes, pedantes e ignorantes da direita, os atores
se precipitaram rapidamente em direção a ela.
Atores e dramaturgos são, acima de tudo,
contadores de estórias, intérpretes da condição humana, cujas palavras e gestos
despertam emoções poderosas em suas platéias. Estórias que cativam e comovem a plateia
são geralmente contos sobre conflito, esforço e triunfo. Podem ser estórias
sobre um despertar pessoal, ou podem ser contos sobre a resistência contra
forças externas — injustiça, ignorância, corrupção. Dessas últimas, é bem mais
fácil emocionar uma platéia com um drama contundente sobre um pobre trabalhador
que se esforça para sobreviver, do que com uma estória que glorifique o sucesso
de um brilhante industrialista. Essas correntes de sentimentos altruístas e
igualitários, tão comuns em nossa sociedade, servem para aguçar a simpatia pelo
primeiro e para tirar o brilho do último. De Charles Dickens a John Steinbeck,
esse tem sido o artifício escolhido por muitos escritores, e muitos atores se
deleitaram em levar tais estórias para o palco e para o cinema.
Além disso, aparentemente a visão de mundo da
maioria dos atores é fortemente influenciada pelo ambiente em que eles
trabalham. Como meu filho salientou, um grupo de atores combinando seus
esforços em algum projeto cooperativo desenvolve poderosos laços comunais uns
com os outros. Seu trabalho é altamente interdependente; o sucesso de cada um
depende do sucesso de todos. Ademais, para criar o produto final, eles podem
gastar juntos a maior parte do tempo em que estão acordados, e por grandes
períodos de tempo. Tudo isso é particularmente verdade para o teatro, onde as
coisas ocorrem ao vivo, mas também é uma característica que vale para os atores
de cinema. O resultado não deveria ser muito surpreendente: intensamente
familiarizados com iniciativas comunais, os atores acabam adquirindo estima por
aquele que acreditam ser um sistema socioeconômico que santifica o impulso
comunal: o socialismo.
Finalmente, gostaria de chamar a atenção para
um fator adicional — um que não foi sugerido pelo meu filho — que pode ser de
considerável significância. Trata-se da noção marxista da
"alienação". Creio que muitas pessoas, não somente os atores,
sucumbem aos apelos dessa idéia, mesmo aquelas que de outra forma poderiam
rejeitar as declarações de Marx. Lembrem-se que Marx e Engels insistiam na ideia
de que o capitalismo "aliena" tanto os proletários como os próprios
capitalistas. Ou seja, ambos perdem a noção dos aspectos cruciais da essência
humana. Os trabalhadores são reduzidos à insignificância, peças facilmente
substituíveis do processo industrial, um pouco melhores do que os componentes
da maquinaria. Seu único conforto está nas drogas e na devassidão. Já os
capitalistas estão cruamente focados em acumular cada vez mais riqueza em
detrimento de uma vida mais equilibrada, que seja agraciada pelos encantos
suaves da literatura, da família e dos amigos. Em ambos os casos, os produtos
do homem presumivelmente se consolidam e, de certa maneira, acabam por
dominá-lo e corrompê-lo. (Marxism, pp. 25-28)
Esse ponto é prolífico em implicações para várias
outras disciplinas, principalmente a psicologia e a sociologia. Qualquer um que
porventura venha a achar que sua atual ocupação (ou vida) é monótona ou
insatisfatória, provavelmente irá buscar na alienação — a menos que essa pessoa
seja amparada por sólidos princípios filosóficos e econômicos — um estratagema
explicativo, um que conforta ao mesmo tempo em que educa erroneamente. E o
próximo passo pode muito bem ser uma adoção irrestrita da máxima socialista,
que já havia sido planejada justamente para alienar. Se formos considerar a
avidez com a qual os atores procuram explorar o funcionamento mais íntimo da
alma humana, torna-se compreensível por que filmes e peças teatrais tão
frequentemente fazem uso dessa ferramenta embalada previamente. A alienação
marxista é sedutora. Assim como a psicanálise freudiana, que só veio surgir
mais tarde, ela oferece uma explicação instantânea para uma enorme variedade de
fenômenos humanos. E, desde que ninguém resolva ver muito de perto as premissas
sobre as quais ela se sustenta, a explicação parecerá muito rica em
discernimento.
Eu gostaria de enfatizar que nada do que foi
dito tem a intenção de isentar aqueles atores e artistas que repetem
incessantemente as banalidades daquela besteira que é o socialismo. Meu propósito
é meramente oferecer um apanhado mais completo dos motivos por trás dessa tão
citada conexão.
Capitalismo e
Ignorância
Permitam-me agora concentrar na segunda ponta
da explicação de Mises para o predomínio de sentimentos anticapitalistas:
ignorância. Como ele coloca:
[As
pessoas] são socialistas [não apenas] porque estão cegadas pela inveja.... [mas
também porque] se recusam obstinadamente a estudar economia e desprezam a
devastadora crítica que os economistas fazem ao planejamento socialista porque,
a seus olhos, por ser uma teoria abstrata, a economia é simplesmente absurda.
Eles fingem acreditar apenas na experiência. (A Mentalidade Anticapitalista,
pp. 14).
Mas por que haveria essa "recusa
obstinada" em se estudar economia? Certamente não são todos os inimigos do
capitalismo que são néscios incultos que mal sabem ler ou escrever. De acordo
com Mises, a omissão do estudo econômico ocorre por dois fatores: (a) objeção a
todas as "teorias abstratas" e (b) dependência de uma experiência
pessoal. Em outras palavras, os princípios universais da ação humana, verdades
atemporais que são válidas em todos os lugares e para todas as pessoas, devem
ser rejeitados. Em seu lugar deve ser implementada, de acordo com as
necessidades, uma corrente infindável de instrumentos estatísticos. A corrente
é infindável porque não se pode jamais esgotar todos os possíveis cenários. Um
novo banco de dados sempre estará pronto para ser usado, logo em seguida. Além
disso, novos e "melhores" métodos de análise de regressão, ou
técnicas de simulação, poderão sempre ser aplicados de modo a refinar e
melhorar estudos passados.
E não se trata de um empirismo amplo e
baseado na realidade, típico de Carl Menger, mas, sim, da extração de dados
feita pelos modernos econometristas. Ela não acrescenta nada de significativo
ao nosso entendimento da economia, mas aumenta significativamente o número de
potencias artigos em periódicos. Ela cria a ilusão de uma ciência em constante
avanço, quando tudo que ela na realidade faz é inundar o campo da economia com
uma imensa quantidade de matemáticos aplicados — e não necessariamente bons
nessa área — que possuem uma compreensão bem superficial dos princípios
econômicos, e nenhum domínio da história da ciência econômica. Pior ainda, eles
obviamente produzem "réplicas" de si próprios, por assim dizer. Isto
é, eles esperam e exigem de seus estudantes uma abordagem econômica semelhante
às suas. Atualmente, temos tido várias gerações de graduandos em economia que,
a cada formatura, parecem saber cada vez menos sobre a economia real.
Essa versão ortodoxa da economia descrita
acima também joga a favor dos inimigos pós-modernos da razão. Se a economia não
mais é vista como um corpo de princípios universais que são deduzidos através
da aplicação da lógica dedutiva a certas proposições axiomáticas, então uma
variedade de conclusões concretas se torna viável. A porta fica completamente
aberta para aquilo que Keith Windschuttle descreveu como o "argumento de
que as ciências ocidentais não têm uma validade universal, mas são meras
expressões daqueles que têm autoridade dentro da cultura Ocidental" (The
Killing of History, p. 270). Agora, é fato que a preocupação principal de
Windschuttle está voltada para alguns modismos entre historiadores e antropólogos,
mas a questão principal transcende todas as disciplinas acadêmicas. "O
relativismo cultural começou como uma crítica intelectual ao pensamento
ocidental, mas agora se tornou uma justificativa influente para uma das mais
potentes forças políticas da era contemporânea. Trata-se do renascimento do
tribalismo no pensamento e na política" (p. 277).
Eis aqui o âmago do assunto em questão. O
pensamento primitivo e tribal é contraposto ao raciocínio abstrato. Ele está
focado no particular, no pessoal, no concreto. Ele reorienta o
"conhecimento" para que este abandone os poderosos processos de
integração e diferenciação em favor da perspectiva limitada da casta, clã ou
tribo. Ele inevitavelmente leva ao relativismo epistemológico, bem como ao
relativismo cultural. Além disso, devemos notar também, como Mises o fez
vigorosamente em Ação Humana, que a moderna rejeição da razão começou de fato
como um ataque à economia:
A
revolta contra a razão foi dirigida para um outro alvo. Não tinha em mira as
ciências naturais, e sim a economia. O ataque às ciências naturais foi uma
consequência lógica e natural do ataque à economia. Seria inconcebível impugnar
o uso da razão em um determinado campo do conhecimento, sem impugná-lo também
nos demais. (p. 73)
Aqui ele está, obviamente, se referindo à
besta que ele chama de polilogismo e ao seu progenitor, Karl Marx:
O polilogismo
marxista assegura que a estrutura lógica da mente é diferente nas várias
classes sociais. O polilogismo racial difere do polilogismo marxista apenas na
medida em que atribui uma estrutura lógica peculiar a cada raça, e não a cada
classe. Assim, todos os membros de uma determinada raça, independentemente da
classe a que pertencem, são dotados da mesma estrutura lógica. (p. 75)
Questionar o poder da razão significa
questionar o valor da mente humana. Uma vez que tais dúvidas são suscitadas, a
abstração é jogada pela janela. Qualquer análise se torna impotente. A educação
se torna um sótão atravancado, no qual itens excêntricos e não correlacionados
são amontoados aleatoriamente. Ademais, como Mises bem notou, a razão humana
tem o mesmo escopo da ação humana. Praticamente não se pode conceber uma sem a
outra. A razão, quando divorciada da ação, torna-se estéril. A ação, quando não
disciplinada pela razão, torna-se despropositada. Algemar a mente significa
restringir a ação, tornar a ação teleologicamente incompetente. Para poder
sobreviver e se desenvolver, o homem precisa fazer uso daquela maravilhosa
ferramenta que ele possui — sua faculdade racional.
Acontecimentos políticos podem de fato
limitar a ação do homem até um grau considerável, mas nenhuma restrição externa
é tão efetiva em estorvar um homem como a proposição filosófica que diz que não
se deve confiar em sua mente. As correntes mais profundas do ceticismo, que
ganharam proeminência nos dois últimos séculos, acabaram por danificar gravemente
os fundamentos que formam toda a base da economia, da ciência, da tecnologia e
da educação.
Como exemplos dessas influências insidiosas,
Mises cita, em Ação Humana, David Hume, os utilitaristas e os pragmáticos
americanos. Estando preocupada com essas mesmas questões, Ayn Rand certa vez
escreveu que a educação era teórica por natureza, ou seja, conceitual. O
estudante "tem de ser ensinado a pensar, a compreender, a integrar, a
provar," mas isso é justamente "o que as faculdades extinguiram,
omitiram e renegaram há muito tempo. O que elas ensinam hoje não tem qualquer
relevância para nada — nem para a teoria, nem para a prática, nem para a
realidade, nem para a vida humana" (The New Left, p. 197). Não consigo
imaginar Mises discordando disso. Não consigo mesmo.
Quase todos aqueles que são acadêmicos como
eu já foram testemunhas melancólicas de uma proeminente manifestação da omissão
mencionada por Rand: a proliferação de acréscimos especiais aos currículos das
faculdades — cursos obrigatórios sobre multiculturalismo, além de toda uma gama
de novos programas sobre Estudos Femininos, Estudos Afro, Estudos Gays e
Lésbicos, Estudos México-Americanos, e por aí vai. Seis décadas atrás Mises já
alertava para os efeitos perniciosos do polilogismo; hoje, estamos vendo
exatamente essa coisa, esteja ela incrustada nas declarações dos objetivos de
uma faculdade ou nos planos de graduação.
Para seu crédito perpétuo, Mises entendeu por
completo aquilo que alguns defensores do livre mercado ainda não conseguiram: o
debate sobre o capitalismo não se trata meramente de discutir qual sistema
socioeconômico vai produzir bens e serviços da maneira mais eficiente, ou sobre
qual está mais de acordo com as preferências individuais dos consumidores. Ele
compreendeu que o debate envolvia isso e muito mais. Ele compreendeu que atacar
o capitalismo significava atacar a civilização em si, atacar o papel da razão
na vida humana — e, com isso, solapar o valor da própria vida. Como ele coloca
em sua franqueza característica, os coletivistas atuais "defendem medidas
que certamente resultarão no empobrecimento geral, na desintegração da
cooperação social sob o princípio da divisão do trabalho e em um retorno à
barbárie". (A Mentalidade Anticapitalista, p. 5).
Como se isso ainda não fosse suficiente para
encerrar o caso, Mises acrescenta o seguinte crescendo, com o qual ele conclui
Ação Humana:
Cabe
aos homens decidirem se preferem usar adequadamente esse rico acervo de
conhecimento que lhes foi legado ou se preferem deixá-lo de lado. Mas, se não
conseguirem usá-lo da melhor maneira possível ou se menosprezarem os seus
ensinamentos e as suas advertências, não estarão apenas invalidando a ciência
econômica; estarão aniquilando a sociedade e a raça humana. (p. 885)
Um chamado às armas
Onde, então, nós nos situamos? Como sabemos,
o socialismo nada mais é do que um puro caos calculacional. Avaliações e
alocações racionais serão, nesse sistema, coisas eternamente ilusórias.
Trata-se de um gigantesco jogo de soma negativa, no qual cada jogador se preocupa
apenas em pegar rapidamente um pedaço do bolo, enquanto este vai diminuindo
rapidamente frente aos olhos de todos. Já o estado assistencialista,
intervencionista e belicista não representa nenhuma melhoria. Cada intervenção
sempre gerará uma outra. A burocracia torna-se a única "indústria"
que garantidamente sempre vai crescer. Cada nova regulamentação taxa o setor
privado, impiedosamente desviando recursos das mãos dos produtivos para as mãos
dos improdutivos. Assim, um verdadeiro capitalismo é o único jogo de soma
positiva disponível.
Em resumo, qualquer argumentação contra o
capitalismo é indefensável. Trata-se de algo puramente ilusório e enganoso.
Está arraigada na inveja e na malícia. É estimulada por uma assombrosa
ignorância em relação a conceitos econômicos verdadeiros, o que
consequentemente se traduz em uma ampla rejeição da razão em si. Esses
anticapitalistas, esses Novos Bárbaros irão — caso tenham a chance — acabar por
destruir não apenas o capitalismo, mas também a educação, a ciência, a
tecnologia, a literatura, as artes, os direitos individuais, a prosperidade e,
inevitavelmente, a própria civilização.
Não, a coisa não virá como uma avalanche de
neve, descendo em cascata montanha abaixo. Será, e tem sido, mais parecido com
uma corrente de água erodindo lenta, porém inexoravelmente a superfície da
rocha até que, eventualmente, o rocha simplesmente deixará de existir. Alguém
poderá dizer que a humanidade está muito relaxada, molenga, deixando-se ser
arrastada em direção ao coletivismo. O que devemos fazer?
Podemos e devemos continuar o magnífico
legado de Ludwig von Mises. Devemos expandir a economia austríaca em cada
direção e maneira possíveis. Devemos estimular a aplicação de critérios
austro-libertários em todas as áreas e em cada tópico imaginável. Devemos
engajar outros estudiosos, estrategistas econômicos e formadores de opinião,
tanto pessoalmente quanto por via impressa. Devemos instruir o público sempre
que houver uma oportunidade. Sabemos que a tarefa não é fácil. Ora, vamos
encarar a verdade. Os coletivistas têm seus tentáculos firmemente inseridos em
cada orifício obscuro do corpo político. Podemos — devemos! — extirpá-los de
lá, expondo-os impiedosamente à luz da razão, da liberdade e da ciência
econômica de Menger, Böhm-Bawerk, Mises e Rothbard. Nesse grande esforço,
talvez possamos alimentar nossa esperança com uma observação oferecida muito
tempo atrás pelo grande patriota americano Samuel Adams:
"Não se requer
uma maioria para se ser predominante, mas, sim, uma minoria irada e incansável,
ávida por acender a chama da liberdade na mente das pessoas."
Até que o dia da liberação finalmente chegue,
dediquemo-nos a ser essa minoria irada e incansável.
*
Larry J. Sechrest era professor de economia na Sul Ross State University, em
Alpine, Texas. Foi membro adjunto do Mises Institute, pesquisador do The
Independent Institute, e o diretor do Free Enterprise Institute. Faleceu a 30
de outubro de 2008.
Tradução
de Leandro Augusto Gomes Roque
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