segunda-feira, 19 de maio de 2014

Quando o socialismo aparentemente funciona



Quando o socialismo aparentemente funciona

por Jim Fedako

Há 27 anos, passei duas semanas na Iugoslávia, aquele suposto paraíso do proletariado, que, de tão paradisíaco, necessitava do braço do ferro do Marechal Tito para manter a população pacificada.  Se a minha memória não me trai, lembro-me de que o país era repleto de lojas de doces — algo que, para uma criança como eu, era uma espécie de "delírio açucarado".
O socialismo é capaz de produzir lojas de doces?  Perfeitamente.  Mas são necessárias algumas considerações.
Sabemos apoditicamente que o socialismo, por causa de suas características intrínsecas (ver o item 11), não é capaz alocar recursos de forma eficiente.  No entanto, também sabemos que o socialismo de fato é capaz de produzir alguns bens, e de fato produz.  E isso ocorre esteja a sociedade estruturada nos moldes do socialismo alemão, do socialismo soviético ou o do socialismo democrático.  Em todas essas três formas de socialismo, há bens sendo produzidos para o consumo das massas.
Nesse período em que estive na Iugoslávia, fiquei próximo da cidade de Ravne na Koroškem, uma cidade siderúrgica situada ao norte do país, que hoje pertence à Eslovênia.  Nosso alojamento foi concedido por uma família que tinha alguns apartamentos térreos para serem alugados.  Todos os apartamentos utilizavam a mesma cozinha (muito pequena) e o mesmo banheiro.  Para ser gentil com essa família, digo apenas que as condições eram — para ser educado — bastante básicas.  A cozinha tinha algumas cadeiras pequenas, uma mesa, poucos talheres e utensílios.  Os quartos eram pequenos e não tinham nada, exceto uma cama com colchão mole demais, um pequeno espelho, uma cômoda e uma cadeira.  O piso era gelado, totalmente de ladrilho.  E as janelas — de tom amarelado e opaco — eram decoradas com cortinas desgastadas.  Para quem não era membro do Partido Comunista, esse tipo de moradia era considerado de luxo no paraíso de Tito.  Para mim, era algo impossível de ser habitado por mais de um mês.
A uma pequena distância de casa estava a loja de departamentos local, chamada Nama — para mim, era apenas uma loja de doces.  Ao passo que exterior era limpo e branco, o interior era escuro e sujo.  Mas havia uma exceção: o corredor que vendia os produtos açucarados.  O pão, duro e sem gosto, era vendido por centímetro, e as poucas postas de carne sobre a mesa imunda dos açougueiros, atrás do refrigerador vazio, tinham um aspecto cinzento e nada comestível.  Ovos?  Papel higiênico?  Frutas frescas?  Nunca vi.  Mas quem se importava, especialmente quando você tem 13 anos de idade e está diante de prateleiras transbordando com caixas reluzentes de biscoitos, doces e sucos excessivamente adoçados?  Tudo era delicioso.  E o preço?  Muito barato.
Obviamente, crianças não são as únicas pessoas que gostam de doces — ou, se permitem o trocadilho, de ofertas doces.  De vez em quando, ouço adultos relatarem versões açucaradas desse arranjo chamado socialismo.  No entanto, tais adultos não fazem alusão a doces.  Eles fazem alusão a serviços de saúde.
As fábulas são todas muito semelhantes, e quase sempre falam sobre idas a um hospital europeu onde a espera era curta e os médicos e enfermeiros eram abundantes.  O preço?  Ora, quem pode reclamar de algo que é gratuito ou quase de graça?  Quero dizer, gratuito ou quase de graça apenas para eles.
Considerando-se essas experiências reais, é de se admirar que as pessoas retornem de uma viagem à Europa defendendo a medicina socializada?  É de se admirar que um garoto como eu, criado em uma cidade industrial, ainda se lembre de um suco tão gostoso e doce, e de biscoitos tão deliciosos, fresquinhos e com gosto de frutas?
O problema é que essas pessoas que defendem a medicina socializada de estilo europeu estão sempre repetindo as mesmas histórias: visitas a um hospital europeu para cuidar apenas de casos simples, como gripe ou alguma outra indisposição corriqueira em viagens.  O que se vê é uma abundância de atendimento para esse nível de doença (trata-se do açúcar na Iugoslávia, por assim dizer).  O que não se vê são os outros tipos de serviços de saúde (a carne, os ovos, o pão etc.).  E é neste ponto que as falhas da medicina socializada são tão óbvias quanto a falta de alimentos nutritivos em uma mercearia da Iugoslávia. [1]
Os relatos desses viajantes mostram um cenário totalmente diferente daquele relatado por pessoas que vivem em países com medicina socializada [ver referências ao final desse artigo].  A realidade é que essas pessoas que vivem nesses países de medicina socializada — aquelas que procuravam por carne na Iugoslávia — reclamam ou da indisponibilidade de serviços médicos ou de terem de aguardar em uma lista de espera por um período tempo que supera a expectativa de vida gerada por uma determinada doença.
Daí que acabamos escutando relatos muito divergentes: os de turistas que são surpreendidos com os doces incríveis, e os de residentes que se queixam da escassez de carne.  E ambos os relatos são verdadeiros.
Pode uma sociedade (ou um setor da economia) organizada sob um arranjo socialista alocar recursos de forma eficiente?  Não.  Pode ela pode produzir prateleiras lotadas de açúcar em lojas sujas, nas quais falta tudo que é essencial?  Perfeitamente. 
Da mesma maneira, pode uma sociedade lotar de médicos e enfermeiros as salas de emergência dos hospitais, com o intuito de satisfazer as necessidades de curto prazo ao mesmo tempo em que as necessidades essenciais de longo prazo ficam sem atendimento? Certamente, e há exemplos reais em todas as partes do mundo.  Pode ela equilibrar essas duas situações? Mais ainda: pode ela equilibrar as duas juntamente com a oferta de todos os outros bens e serviços desejados?  Não enquanto vivermos em um mundo caracterizado pela escassez de recursos.  Logo, tal arranjo é impossível de ocorrer neste mundo.
Bastiat e Hazlitt sempre enfatizaram que, na economia, há aquilo que se vê e aquilo que não se vê.  Um economista tem de ser igualmente versado nas duas artes.  É essencial que o invisível esteja incluído em qualquer consideração sobre uma situação.  E isso é válido mesmo quando, como uma criança de 13 anos, você quer ignorar as prateleiras sujas e vazias e se concentrar apenas no oásis de açúcar.

[1] A família com a qual ficamos conseguiu fornecer uma refeição agradável quando nos convidou para jantar.  Só que aquela comida não havia sido adquirida por meios legais.


Fonte: http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1863

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