Uma porta para o
século 21
Editorial do Jornal O
Estado de São Paulo – p. A3 – 04/08/2016
O Brasil tem uma nova chance de ser uma
economia do século 21, produtiva, eficiente, inovadora, capaz de competir em
todo o mundo e de criar oportunidades para todos. Para isso terá de se integrar
na cadeia internacional de produção, numa política inteiramente oposta àquela
implantada em 2003. Naquele ano o PT assumiu o governo federal e decidiu manter
o País, apesar de todo o seu potencial, na terceira divisão da economia global.
Na terceira, de fato, porque na segunda jogam os emergentes guiados por uma
pauta de modernização e administrados de forma prudente e pragmática. O caminho
para a modernidade passa por uma nova política de comércio e de desenvolvimento
produtivo, tal como propõe estudo elaborado pelo Centro de Debate de Políticas
Públicas (CDPP), de São Paulo, e pelo Centro de Estudos de Integração e
Desenvolvimento (Cindes), do Rio de Janeiro.
Abertura é apenas uma das marcas dessa
política, já testada com resultados muito bons em dezenas de países. Mas a
palavra abertura provoca reações negativas em muitos empresários e
sindicalistas.
Para uma parcela significativa do
empresariado, é sempre muito cedo para reduzir tarifas e abandonar políticas de
conteúdo nacional, como se o Brasil estivesse ainda no estágio da
industrialização nascente. A reação negativa inclui, quase sempre, referências
a desajustes macroeconômicos, a problemas de competitividade e à cobrança de
incentivos governamentais.
Do lado sindical, o discurso costumeiro
inclui o risco do desemprego como efeito da competição estrangeira – um temor explorado
com sucesso em campanhas como a do republicano Donald Trump. Para evitar a
mistificação e neutralizar a conversa dos aproveitadores do atraso e dos
favores oficiais, é preciso pôr a discussão nos termos corretos.
Não há como pensar separadamente, em especial
num país emergente ou em desenvolvimento, as políticas comercial, de
crescimento e de modernização da economia. Para começar, a agenda proposta nos
estudos do Cindes e do CDPP inclui uma revisão e reorganização de tarifas de
importação em níveis diferenciados. Haveria redução, até porque muitas tarifas
são escandalosamente altas, mas nenhum setor seria entregue sem proteção, de um
dia para outro, aos competidores estrangeiros. A mudança, no entanto, deveria
ser suficiente para estimular os empresários a pensar com mais seriedade em
temas como produtividade e qualidade.
A mudança deveria incluir, naturalmente, a
eliminação da política de conteúdo nacional, ineficiente, custosa e estimulante
de bandalheiras, como ficou evidenciado na experiência dos últimos anos. Essa
política foi um dos componentes da devastação econômica e financeira da
Petrobrás. Outra aberração, o programa de criação de campeãs nacionais, já foi
abandonada, depois de muitos erros e de muito desperdício de dinheiro público.
A liquidação final e completa dos benefícios fiscais a setores selecionados
também é inadiável.
Os itens listados até aqui compõem um
programa de profilaxia econômica e até moral. Mas uma reforma efetiva tem de
incluir uma porção de outros itens. Não é necessário um estudo assinado por
economistas de primeiro time para listar algumas das mudanças mais importantes.
É preciso tornar a tributação menos prejudicial ao investimento, à formação de
custos e à competitividade. É indispensável diminuir a burocracia oficial e
simplificar o cumprimento de exigências legais pelas empresas. É urgente mudar
a diplomacia econômica, para facilitar a integração do País nos principais
fluxos de comércio e de produção – o oposto do terceiro-mundismo em vigor a
partir de 2003. É indispensável tornar mais eficiente o governo e revitalizar o
investimento público.
Resta, enfim, passar a limpo a política
educacional, a longo prazo o fator mais importante da competitividade. São
mudanças politicamente complicadas, tanto mais quanto mais o empresariado
insistir na manutenção do protecionismo, dos favores fiscais e financeiros e da
mediocridade.
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