quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Thomas Piketty e seus dados improváveis


Thomas Piketty e seus dados improváveis

por Hunter Lewis


O principal livro de Keynes, A Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, está repleto de teoria econômica.  Há apenas duas páginas contendo dados, e Keynes ainda desqualifica esses dados dizendo que são "improváveis".
Em contraste, o novo livro do francês Thomas Piketty, O Capital do Século XXI, que é a sensação mundial do momento, é recheado de dados. Ironicamente, Piketty se considera um sucessor daquele mesmo economista cujos dados Keynes descartou como improváveis: Simon Kuznets.  Quase todas as pessoas que realmente leram o livro admitem que o argumento teórico de Piketty é fraco.  No entanto, seus defensores prontamente contra-argumentam: "Mas veja todos esses dados! Não dá para argumentar contra todo esse volume de evidências históricas!"
O principal argumento de Piketty é que a riqueza (que tende a se concentrar em poucas mãos) cresce mais rapidamente do que a economia, de modo que aqueles que já possuem muita riqueza vão se tornando cada vez mais ricos em relação a todos os outros. Supostamente, esta seria uma característica inevitável do capitalismo.
(Se essa tese lhe soa familiar, é porque ela realmente é: a teoria de Piketty é apenas uma repetição mais atualizada do que Marx e Keynes já haviam dito, embora seja válido lembrar que Keynes zombou da maioria das coisas ditas por Marx, classificando-as como "embuste").
Mas qual seria então a prova de que a riqueza cresceu mais rápido do que a economia?
Analisemos o gráfico abaixo, que foi adaptado do livro de Piketty. A linha roxa é o retorno sobre o capital e a linha amarela é a taxa de crescimento da economia mundial. A linha roxa supostamente mostra como os ricos estão se saindo e a linha amarela, como o cidadão médio está progredindo.  Observe que as partes de ambas as linhas localizadas na extrema direita do gráfico são meramente uma projeção de Piketty, e não dados históricos.


Este gráfico é espantoso por várias razões.  Em primeiro lugar, ele sugere que o capital apresentou um retorno de 4,5% ou mais, por ano, no período que vai do ano 0 ao ano 1800.  Este valor é insano.  Por exemplo, se toda a raça humana houvesse começado o ano 1 com uma riqueza total de apenas US$10, um crescimento composto de 4,5% ao ano durante 1.800 anos faria com que, atualmente, fossemos mais de um trilhão de vezes mais ricos do que realmente somos — lembrando que a riqueza total do mundo foi estimada pelo Credit Suisse em US$241 trilhões de dólares.
Esse valor de 4,5% de retorno sobre o capital também é insano porque o próprio Piketty argumenta, e muito corretamente, que todo o crescimento econômico ocorrido antes da Revolução Industrial foi insignificante, o que significa que retornos tão altos para os ricos simplesmente não são compatíveis com um crescimento tão ínfimo.  A verdade é que, durante boa parte desse período, os ricos estavam mais interessados em gastar ou em esconder suas riquezas a investi-las, pois, naquela época, expor suas riquezas significava se tornar suscetível a ser roubado — ou por bandidos ou pelo governo.
Por fim, se analisarmos mais atentamente a parte mais atual do gráfico (1913 a 2012) e ignorarmos a projeção feita para o futuro, veremos que as linhas também não dão sustentação à tese de Piketty.  A ideia de que, no capitalismo, os ricos sempre necessariamente se tornam mais ricos em relação a todos os outros simplesmente não é corroborada pelos dados que ele apresenta.
Já o gráfico seguinte mostra a fatia da riqueza nas mãos dos 10% mais ricos da Europa ao longo do tempo (linha azul-escura), a fatia de riqueza nas mãos dos 10% mais ricos dos EUA (a linha verde clara), a fatia da riqueza nas mãos do 1% mais rico da Europa (linha azul-clara) e a fatia da riqueza nas mãos do 1% mais rico dos EUA (a linha verde-escuro).

Este gráfico também não corrobora a tese de Piketty.  Sim, a fatia dos ricos cresceu desde 1970, mas só depois de ter caído acentuadamente antes.


Finalmente, o próximo gráfico mostra a renda dos 10% mais ricos dos EUA ao longo do tempo em termos da porcentagem da renda total do país.
Renda, neste caso, inclui também os ganhos de capital, que, em termos práticos, não representam renda verdadeira, mas sim apenas uma troca de um ativo por outro.  E exclui as transferências de renda feitas pelo governo, exclusão essa gera uma grande alteração nos resultados. Ainda assim, mais uma vez, não se observa nenhum aumento inexorável na renda dos mais ricos ao longo do tempo.  Longe disso.


O que realmente vemos no gráfico acima são dois picos para as pessoas de maior renda: um imediatamente antes da crise de 1929 e o outro imediatamente antes da crise de 2008.  Ambos os picos ocorreram justamente durante as duas maiores bolhas econômicas da história americana, nas quais o Banco Central americano, em conluio com o sistema bancário, estimulou a expansão do crédito e criou muito dinheiro, o que gerou uma falsa e insustentável prosperidade.  Ambas também foram eras que representaram o ápice do capitalismo corporativista — também chamado de "capitalismo de compadrio" —, no qual aquelas pessoas ricas que tinham conexões com os governos utilizaram o dinheiro criado pelo sistema bancário para se tornar ainda mais ricas ou simplesmente se beneficiaram de outras políticas governamentais que as favoreciam.
Infelizmente, após a crise de 2008, o ativismo dos bancos centrais ao redor do mundo inflou outra bolha nos mercados de capitais.  Isso elevou a fatia da renda dos mais ricos novamente para o patamar de 50% da renda total em 2012, baseando-se em dados foram disponibilizados após a publicação do livro.  Só que essa nova bolha também irá estourar, o que derrubará a fatia da renda dos mais ricos de volta ao patamar dos 40% observados em 1910, início do período analisado pelo gráfico.
Talvez a afirmação mais surpreendente do livro de Piketty é a de que as burocracias governamentais terão de ser reformadas para que possam fazer um uso mais eficiente de toda a receita adicional que será gerada pelos novos impostos sobre renda e sobre a riqueza que ele recomenda.  A suposição é a de que o controle governamental quase que completo sobre a economia seria o melhor arranjo, ainda que esse mecanismo necessite de alguns ajustes para ser definitivamente implantado.
Ludwig von Mises demonstrou, há quase 100 anos, que uma economia gerenciada pelo  estado simplesmente não tem como funcionar, pois, entre outros problemas, ela não é capaz de estabelecer preços racionais. Só uma economia guiada pelos consumidores pode fazer isso.  Os socialistas têm tentado refutar a tese de Mises desde então, mas nunca conseguiram. Piketty deveria ao menos ler Mises.



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