Supermercado emprega
menores ex-infratores em sigilo
Luísa Melo - EXAME.com
- 30/06/2014
O Grupo Pão de Açúcar (GPA) está
empregando e orientando menores infratores sem contar para ninguém quem eles
são - nem mesmo para os seus próprios funcionários. A iniciativa acontece há uma
década, muito discretamente e este ano, o programa Gente de Futuro ganha uma
nova abordagem: além de formar esses jovens para o mercado de trabalho, a
empresa dará suporte também às suas famílias.
Desde 2004, a rede faz uma parceria com a
Fundação Casa para recrutar e contratar pessoas que cumprem, ou já cumpriram medidas
socioeducativas, para atuarem nos supermercados Pão de Açúcar e Extra e na sua
sede administrativa, em São Paulo.
Mas foi em 2009 que a prática tomou
forma de projeto. "Não se trata de cotas legais a serem cumpridas, como o
acontece no Menor Aprendiz. É social mesmo", diz Elisabete Fonseca,
gerente de RH do grupo.
Requisitos
Para participar, os jovens com idade
entre 17 e 21 anos precisam ser indicados pela instituição. Depois, eles passam
por um processo seletivo elaborado pela empresa. O projeto tem duração de 12
meses e, a cada ano, são abertas de 20 a 30 vagas. Para 2014, foram 70
candidatos pré-selecionados para 25 postos de trabalho abertos. A seleção ainda
está em curso e 10 deles já foram preenchidos.
A escolha, que deve terminar em julho,
passa pela análise de uma consultoria e por uma entrevista com um gestor e leva
em conta a vontade e o perfil do jovem. É depois de identificar o potencial dos
candidatos que a varejista busca as vagas em lojas próximas à região onde eles
moram - num processo inverso ao natural.
Preconceito
Depois de selecionados, os jovens são
efetivados como qualquer outro funcionário do GPA. O programa é sigiloso e só
os gestores sabem quem são as pessoas que participam dele. Para o restante da
equipe, não há distinção para evitar qualquer possível preconceito.
As
vagas
A maioria deles é contratada para
atuar nas áreas de operação dos supermercados da rede e alguns (cerca de 20%)
são destinados à sede administrativa da empresa. "Muitos começam aprendendo
um ofício como o de padeiro, ou açougueiro, e realmente constroem uma carreira
nessas profissões", conta Elisabete.
Treinamento
O único tratamento diferenciado que os
integrantes do Gente de Futuro recebem é ter de participar de reuniões
quinzenais que trazem treinamentos e palestras, organizados pela consultoria
parceira. Os encontros duram quatro horas e neles são tratados temas como o
autoconhecimento, o diálogo, a relação com a família e o papel do jovem
profissional na sociedade. "São pessoas muito fortes, mas também muito
machucadas e que, por isso, às vezes criam mecanismos de defesa",
justifica Elisabete sobre a necessidade desse tipo de orientação.
Gerenciamento
Os chefes que irão comandar
funcionários do Gente de Futuro também são preparados especialmente para
recebê-los. Durante um dia, eles são treinados pela consultoria para
"aprender a administrar as falhas dos jovens de maneira construtiva",
segundo explica Elisabete. No decorrer do ano, os líderes também participam de
pelo menos dois encontros com a equipe de RH da companhia e a consultoria para
discutir o andamento do programa e discutir as dificuldades e oportunidades dos
empregados que fazem parte dele.
Contratação
Passados os 12 meses, o funcionário do
Gente de Futuro que estiver se dando bem no trabalho continua na companhia. Na
média, 50% deles permanecem no emprego depois desse período. Elisabete conta
que não há muitos registros de que o GPA precisou desligar os jovens. "Só
acontece em casos extremos. Mas alguns realmente desistem porque retornam à
criminalidade", afirma, sem falar em números.
Entre aqueles que não vão embora, uma
média de 12% são promovidos. "Quando eles ficam, o índice de engajamento é
muito grande, porque nós os ajudamos a reconstruir a sua história", diz a
gerente.
Hoje, 10 funcionários que vieram do
projeto ainda estão na companhia. Deles, cinco já tem entre 5 a 9 anos de casa,
sendo que um deles ocupa um cargo de média liderança. "Tem também o caso
de uma pessoa que nos deixou para ser sommelier
em uma grande adega", conta Elisabete.
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