O oportunismo político-ideológico explorando a tragédia aérea
da VoePass
Marco Milani
A atribuição de causas a eventos trágicos, como
acidentes aéreos, muitas vezes é marcada por análises que refletem percepções
ideológicas, em detrimento de uma avaliação objetiva das circunstâncias
envolvidas. Recentemente, o acidente ocorrido com a companhia aérea VoePass foi
alvo de uma narrativa oportunista que o relaciona à ganância que supostamente seria
inerente ao sistema capitalista, argumentando-se que a busca incessante por
lucro teria comprometido a segurança dos passageiros. Embora essa perspectiva
possa encontrar algum respaldo em casos em que práticas empresariais
irresponsáveis contribuam para falhas operacionais, é imperativo reconhecer que
a ganância, enquanto expressão de uma postura moral, não é exclusiva de um
sistema específico, mas sim uma característica humana que transcende fronteiras
políticas, sociais e econômicas.
Uma análise histórica e comparativa dos acidentes
aéreos em diferentes contextos reforça essa tese. No período da Guerra Fria e
nos anos que se seguiram, países com regimes socialistas ou comunistas também
testemunharam acidentes trágicos envolvendo suas companhias aéreas, cujas
causas podem ser atribuídas, em parte, à ganância ou à falta de priorização da
segurança. Exemplos emblemáticos incluem acidentes com a Aeroflot, a principal
companhia aérea da União Soviética, como o Voo Aeroflot 217 em 1972 e o Voo
Aeroflot 3352 em 1984. Esses eventos, que resultaram em centenas de mortes, ocorreram
em um ambiente onde o lucro, no sentido capitalista do termo, não era o
principal motor das operações. No entanto, as falhas administrativas, técnicas
e, em alguns casos, a negligência das autoridades, demonstram que posturas
inadequadas como a falta de responsabilidade podem manifestar-se de diversas
formas, independentemente do sistema econômico vigente.
Outro exemplo relevante é o acidente envolvendo o Voo
Cubana de Aviación 9646 em 1989, em que a companhia aérea estatal cubana sofreu
uma catástrofe após a decolagem, resultando na morte de todos os passageiros e
tripulantes, além de vítimas em solo. Novamente, embora o contexto econômico
fosse socialista, a tragédia foi associada a falhas técnicas graves e à
manutenção inadequada, refletindo uma preocupação insuficiente com a segurança
em prol de outros objetivos, que, ainda que não ligados diretamente ao lucro,
configuram uma forma de descuido que pode ser associada à ganância
institucional.
Assim, supor que determinado sistema econômico, por
si só, seja o culpado por tragédias como a da VoePass é uma simplificação oportunista
que ignora a complexidade das questões envolvidas e a universalidade das falhas
morais que podem existir em qualquer contexto humano. A verdadeira solução para
evitar tais tragédias não reside na mudança de um sistema econômico para outro,
uma vez que há inúmeros cenários com maior ou menor intervenção estatal no
mercado e na vida das pessoas, mas no fortalecimento de valores éticos e na
implementação de políticas e práticas que garantam a segurança e o bem-estar
como prioridades efetivas. Somente por meio do aprimoramento moral do indivíduo
pautado pela liberdade e valorização da vida humana acima de outros interesses,
será possível mitigar a influência da ganância em qualquer contexto econômico
ou político.
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