quinta-feira, 1 de outubro de 2015

Oswaldo Cruz e o mercado


(Texto publicado no jornal Correio Popular - Campinas, 2/10/15, p. A2)

Oswaldo Cruz e o mercado

Marco Milani*

No início do século passado, o médico sanitarista Oswaldo Cruz promoveu uma campanha de caça aos ratos objetivando a erradicação da peste bubônica na cidade do Rio de Janeiro. Os cidadãos que capturassem e entregassem os animais seriam recompensados financeiramente. Não tardou para que alguns identificassem uma nova oportunidade de negócios e passassem a criar ratos para vendê-los ao Governo. A criação foi considerada ilegal e seus responsáveis foram presos.
A intenção de Oswaldo Cruz era a de dizimar os ratos por motivos de saúde pública, porém, ao remunerar a caçada, incentivos não previstos agiram no sentido contrário e estimularam a procriação dos roedores.
Uma grande lição econômica exemplificada nesse episódio no Rio de Janeiro é que não se pode prever e determinar o comportamento do ser humano, o qual é criativo e tem interesses variados. Apesar de quase evidente, esse aspecto da imprevisibilidade é recorrentemente ignorado por governantes com viés intervencionista, os quais sucumbem à tentação de interferir artificialmente no funcionamento do chamado “mercado”.
Ora, mercado é justamente o ambiente no qual os indivíduos manifestam voluntariamente seus interesses e expectativas para a oferecimento e aquisição de produtos. É no mercado que os agentes econômicos, que em última instância são os indivíduos, interagem. Quanto mais o Governo intervir e regular o seu funcionamento, maiores as possibilidades de interações ineficientes e ineficazes, impactando negativamente toda a economia.
Lamentavelmente, o descaso com os fundamentos econômicos baseados na livre iniciativa e nas condições para o aumento de produtividade e competividade, além da crença distorcida de que o Governo deveria determinar quais setores e grupos de pessoas seriam privilegiados para estimular o desenvolvimento econômico, contribuíram para a situação em que nos encontramos hoje.
Após mais de uma década de equivocadas políticas econômicas que corroeram a base de desenvolvimento deste País, os pífios resultados colhidos não surpreendem. Sob a orientação ideológica que prezou mais o discurso ilusório do que os fatos, o Brasil perdeu o bonde da história e agora enfrenta sérias dificuldades para adotar medidas emergenciais para a recuperação econômica.
As vantagens artificiais oferecidas pelo Governo a alguns empresários, em detrimento dos demais, foram feitas com a esperança de que determinados setores liderassem o processo desenvolvimentista. Os fatos desmascararam essa pretensão irreal. Igualmente, financiamentos subsidiados a governos estrangeiros com a justificativa de que isso favoreceria empresas brasileiras é outra tentativa de subverter a lógica do mercado. Deve ser a competitividade a guiar a escolha de contratos e não interesses questionáveis.
Que os formuladores de políticas se lembrem que os agentes econômicos reagem a incentivos e oportunidades e que o livre mercado tem muito mais a contribuir para o desenvolvimento econômico do que governantes intervencionistas conseguem prever.
          O Brasil precisa de um Estado menor, menos inchado e com governantes que defendam a livre iniciativa com base na inovação e competitividade.


* Economista. Pós-doutor pela Universidade de Salamanca (Espanha). Professor da Unicamp.

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